quinta-feira, 1 de setembro de 2016

Dizem que sou louco, por pensar assim

Acabo de assistir "Nise- coração da loucura".
Muito se engana quem acha que aquilo é um retrato exagerado...infelizmente.

Me lembrei da primeira vez que estive num Hospital Psiquiátrico. E do cheiro que senti ali- era tão forte que naquele dia não consegui almoçar ou jantar.
Estava no segundo ano de faculdade, em 2004. Fomos pela disciplina de Psicopatologia. Fomos mais de uma vez, mas aquela primeira foi marcante. Nem no auge da minha imaginação conseguiria pensar em algo parecido com aquilo.

Abandono, acho que é a palavra que melhor define.
As pessoas estavam largadas, abandonadas. Foram vários momento impactantes, mas o maior deles foi meu professor que causou.
Existiam duas alas- masculina e feminina. Para passarmos de uma ala para outra, tinha um portão. Estávamos na ala masculina esperando que abrissem o portão da feminina.
Um interno disse para meu professor "olha ali Doutor, um passarinho azul". Meu professor respondeu  "Não vejo nenhum passarinho, senhor".

Fiquei muito incomodada. Mais incomodada do que quando voltei lá com o pé enfaixado.
Nesse dia me questionei se estava pronta para essa profissão. Eu não conseguia negar para aquele homem que não tinha passarinho, muito menos entendia porquê dizer isso. Eu queria saber o que ele estava querendo me contar, o que aquele passarinho significava para ele. Achei que até o quinto ano entenderia o que o meu professor tinha feito, mas hoje, 12 anos depois, continuo sem entender.

Não tenho a coragem e o preparo de Nise, que pouco se importa com a falta de apoio e de credibilidade dos outros. Ela acredita piamente em seu trabalho- nisso, somos parecidas. A frase mais bonita do filme é "observe e cale a boca, deixe eles em paz".  Às vezes as pessoas só precisam de um abraço, ou de um ouvido aberto a escutar de verdade. Mas para isso é preciso livrar-se de preconceitos, de medos e principalmente ter paciência (então, afinal quem é o real paciente nessa história toda?). Não é fácil, não mesmo.

Mas o principal é acreditar no ser humano e ter a certeza de que ele sempre saberá mais qual o melhor caminho para ajudá-lo. O terapeuta será apenas o facilitador desse processo. Por isso que até hoje me pergunto o que aquele passarinho contaria daquele homem, que no meio de tanta tristeza, conseguia enxergar o azul.